DIÁLOGOS INSANOS DA PANDEMIA
Chaminé da antiga serraria em Porto Velho - RO, às margens do rio Madeira |
Por Antônio Serpa do Amaral Filho ( Basinho )
No infortúnio da solidão atroz, o jeito é quedar-se nu com a mão no bolso, olhando para as impassíveis paredes que miram, espiam a gente até de rabo de olho, porém não articulam um verbete sequer, como que querendo passar a régua no acerto de contas de quem as tratou tão mal e com cotidiana indiferença por anos a fio! Logo elas, tão geograficamente fieis ao nosso dia-a-dia, companheiras de todas horas, guardiães de toda nudez da alma, testemunhas oculares da crueza espúria ou mui digna da nossa condição humana frente ao desafio de não braiar pra sapo morando na beira da lagoa.
Assumida a situação de pandemicamente emparedado, restou-nos a ingrata opção de pelo menos trocar uma prosa madrugadeira com elas, as paredes da casa, entidades que, no horror do lento passar das horas, parecem ganhar um sopro de vida, já que um dia vieram da região do bairro lá do Areal, no original de suas vidas minerais, mas não tem boca, a não ser boca de siri e sonsos bocejos articulados de forma dissimuladas, como se não fosse possível uma boa e velha conversa com esses seres feito de minério secular, tijolos e argamassa! Não subjuguem as Paredes! Elas são vingativas! Tratem-nas como se elas fossem seu cachorrinho de estimação!
É ultrajante para um ente pensante ser explicitamente tratado com desprezo pelas paredes de sua própria casa! Fossem as paredes da Casa Branca, da Casa Rosada ou da Dinda (Deus me livre!), tudo bem; são paredes de ambientes famosos e distantes da modesta vida que a gente vive na Vila da Poesia, na Zona Sul do Porto do Velho Pimentel. E já que não tem papo, o jeito é botar a mão na massa da Operação Lava Jato Caseira e passar mais uma vez o sabugo ensaboado nos couro de rato recebidos em troco do Mercadinho Tibúrcio, de onde vem essas malfadadas pecúnias, talvez apinhadas desse animalzinho microscópico que anda por aí matando meio mundo de gente mundo afora. E assim, na sofreguidão da paranóia que vem acometendo a todos indistintamente, com a Senhora da Foice grudada no calcanhar de Aquiles de todos nós, é que me dano mesmo, confesso de público, a lavar dinheiro, nota por nota, moeda por moeda, que também eram escaldadas, levando-as em seguida ao varal monetário não muito rico do fundo do quintal, porque sou pobre de marré de si, mas acolhedor e profilático na hora de receber as cédulas ainda encharcadas e quase desbotadas de tantos esfregões recebidos em sua planície retangular. Agora vejo que lavar notas de dinheiro e botar no quarador não é tarefa fácil, é uma arte, na verdade, não é pra qualquer um! É coisa para profissional, não é para um amador pé-rapado como eu! Com as devidas ressalvas morais e criminais, obviamente, tiro o chapéu aqui para os políticos que são dados a essa prática, pois vi que não é brinquedo não, principalmente se a gente o faz de forma artesanal e com medo de morrer cedo e não concluir as mal traçadas linhas em prosa ainda por publicar!
O grande cronista Altair Tatá não esteve in loco no local das cenas por ele retratadas nesta peça literária! Mas com certeza fez uso de alguma delação premiada de alguém que pernoitou por noites a fio na Vila da Poesia e assistiu alguns devaneios e soube dessa estória, de um falante metido a intelectual querendo jogar conversar fora com paredes não-falantes! Deus não deu asa à cobra por isso. Se as paredes falassem, estaríamos todos lascados!!
E assim mesmo! As paredes não falam, assim como as rosas não falam, mas simplesmente elas exalam os sussurros e cochichos existenciais vivenciados que a aflição e o desespero solitário roubam de mim!
O jeito então é colar receita de tomate recheado do Youtube e mandar vê! Tomates também não falam; mas, recheados com ovo, cheiro-verde, orégano, queijo ralado e chicória, fazem um bem danado à fome das altas horas de perdição e loucura!
Forte abraço ao cronista Altair Tatá Lopes, que discorreu sobre a nossa lavagem de dinheiro! Sou réu confesso de suas narrativas peripatéticas!
Antônio Serpa do Amaral Filho (Basinho)
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