REPÓRTER PARAENSE MORRE EM MARICÁ
Por Zola Xavier da Silveira *
EDSON TORRES - O REPÓRTER
Com a camisa do Paysandu - Foto: Acervo da família
Por Zola Xavier
Foto: Acervo da família - 1977
Foto: Acervo de família
Outro assunto recorrente em nossos papos, foi a luta clandestina de resistência à ditadura militar. Leitor voraz, conhecedor dos clássicos de nossa literatura e de outros tantos autores estrangeiros, especialmente os franceses, sendo comum ouví-lo, nos encontros que tivemos na redação do jornal A Voz de Maricá, de propriedade do decano da imprensa maricaense, seu Arthur Ribeiro, o Pedro Azulão, falar de suas leituras, de sua juventude na Belém dos anos cinqüenta, quando percorria os sebos garimpando livros, todos eles marcados pela sua visão humanista da vida, entre os quais, citava sempre o livro Germinal, obra prima do escritor francês Émile Zola. Claro que a política permeava todos os assuntos e, nesse ponto, Edson era um especialista. Pertenceu à geração dos comunistas românticos. Falava com a segurança de um repórter que cobriu sua própria experiência, vivenciada nas redações em que exerceu sua profissão. Eram esses os papos recorrentes, sempre com suas risadinhas enigmáticas, qual Mona Lisa.
Foto: Acervo da família
Com seu neto Guilherme na escola Sonho da Tia Regina
Nos seus últimos meses de vida andava muito fraco.
Estive no seu enterro. Fui representando, em sentimentos, os ideais comuns que compartilhamos. Fiquei com as memórias do convívio com o repórter paraense, construídas nos inúmeros encontros que tivemos na cidade que nos acolheu.
EDSON TORRES - O REPÓRTER
Com a camisa do Paysandu - Foto: Acervo da família
Por Zola Xavier
Tive a oportunidade de conhecer o jornalista Edson Torres de
Oliveira e ter tido com ele, em pauta aberta, longos e agradáveis papos, trocando impressões sobre vários aspectos da vida, incluindo, aí, o futebol. Ele vascaíno e eu
torcedor do Mengão, mas em convivência pacífica amalgamada pela paixão comum, o Paysandu,
o Papão de Belém do Pará, cidade onde ele nasceu em 11 de setembro de 35.
Ainda muito jovem Edson começou a trabalhar na rádio e no jornal O Liberal, tradicionais veículos de comunicação de sua Belém.
Ainda muito jovem Edson começou a trabalhar na rádio e no jornal O Liberal, tradicionais veículos de comunicação de sua Belém.
Foto: Acervo da família - 1977
Quando chegou ao Rio de Janeiro, nos anos 70, já tinha
consolidado sua militância pelas causas socialistas. Em meados de 74, eu consegui um emprego no
Sindicato Nacional dos Aeronautas, onde ele também trabalhou fazendo o jornal A Bússola. Estivemos
ligados a mesma tarefa, Edson como jornalista e eu como contínuo encarregado
pela expedição do jornal. Não nos conhecemos nessa ocasião, talvez levado pelo pequeno período em que fiquei no
emprego, conseguido, tanto eu quanto
ele, graças à influência de alguns
diretores do sindicato ligados as mesmas concepções políticas que tínhamos.
Edson ficou por lá por um longo período editando o jornal dos
aeronautas, enquanto que eu fui ser diretor de comunicação do sindicato dos
Bancários do Rio. Vivíamos, nessa época, a grande campanha pela anistia dos
presos políticos; tempos de incertezas,
com riscos permanentes de retrocesso na sombria conjuntura política de então.
No Rio de Janeiro, capital, os bancários cariocas e seu sindicato participaram
das grandes mobilizações pelas liberdades democráticas. Era o ano de 1979.
Foto: Acervo de família
Na Revista O Cruzeiro 1977
Com a aproximação das eleições de 82, Edson adere à memorável
campanha que elegeu Leonel Brizola governador do estado do Rio de Janeiro e, para deputado, apoiou os socialistas Afonso
Celso, Afonsinho, deputado cassado em 1964, Acácio Caldeira e Eduardo Chuay.
Nesta eleição, Afonsinho foi o candidato apoiado por muitos médicos do
movimento sindical na cidade do Rio de Janeiro, dentre eles a jovem Dra Janete Valladão. Talvez esteja aí a explicação do seu carinho por ela.
Tempos depois, Maricá
nos proporcionou um “reencontro”. Assim foi que nos conhecemos melhor,
relembramos passagens comuns que tivemos no movimento sindical carioca, no
final da década de 70.
Foto: Acervo da família
“Sempre considerei muito esse homem, porque era um
homem de palavra e não é porque morreu não, quando morre fica bonzinho,
né? Conheci o Edson no Cacique de Ramos no carnaval de 73. Em
setembro de 82 foi que ele me pediu em casamento e sabe pra quem? Para os meus
filhos, foi uma emoção muito grande. Você sabe que eu fui chamada na escola do
meu filho, pois ele estava chorando porque eu não queria casar com o pai dele,
aí tive que casar né? Nos casamos em 23 de outubro de 82
numa igreja na Barra da Tijuca” declarou dona Dalva Torres.
Em nossos papos, vez por outra, ele falava com prazer de
suas reportagens publicadas na revista O
Cruzeiro. Por vários anos Edson trabalhou nessa histórica revista. Sentia-se, sempre, esse prazer nostálgico quando
relembrava as inúmeras e
boas reportagens que fizera. Certamente, ali foi o grande manancial para o
seu livro “Memórias de um Repórter", trabalho em que dedicou-se
nos meses finais de sua vida. Se foi concluído, não sei.
Foto: Acervo da família
Outro assunto recorrente em nossos papos, foi a luta clandestina de resistência à ditadura militar. Leitor voraz, conhecedor dos clássicos de nossa literatura e de outros tantos autores estrangeiros, especialmente os franceses, sendo comum ouví-lo, nos encontros que tivemos na redação do jornal A Voz de Maricá, de propriedade do decano da imprensa maricaense, seu Arthur Ribeiro, o Pedro Azulão, falar de suas leituras, de sua juventude na Belém dos anos cinqüenta, quando percorria os sebos garimpando livros, todos eles marcados pela sua visão humanista da vida, entre os quais, citava sempre o livro Germinal, obra prima do escritor francês Émile Zola. Claro que a política permeava todos os assuntos e, nesse ponto, Edson era um especialista. Pertenceu à geração dos comunistas românticos. Falava com a segurança de um repórter que cobriu sua própria experiência, vivenciada nas redações em que exerceu sua profissão. Eram esses os papos recorrentes, sempre com suas risadinhas enigmáticas, qual Mona Lisa.
Foto: Acervo da família
Com seu neto Guilherme na escola Sonho da Tia Regina
Nos seus últimos meses de vida andava muito fraco.
Poucos dias antes de seu falecimento estivemos juntos no
escritório de sua amiga Janete Valladão, no centro de Maricá. Estava bastante
debilitado, mesmo assim subiu os degraus do pequeno edifício, chegou ofegante,
sentou-se e descansou por alguns minutos. Com gestos e palavras entrecortadas
conversamos demoradamente, como se fosse pela última vez, e foi. Depois, descemos
as escadas e nos despedimos, fiquei parado vendo-o cada vez mais se
distanciando por entre os transeuntes, numa certa manhã de junho de 2016.
Edson era um jornalista carnal, de pena certeira. Aqui em Maricá trabalhou no jornal “Tribuna de Maricá” e na revista “Justiça e
Cidadania” ambos de propriedade de Orpheu Salles. Depois fundou o “Jornal do
Município”, sua última trincheira.
Edson sabia onde queria chegar, sem abandonar os seus
princípios e sua dialética marxista, e, neste aspecto, o
jornalista não era imparcial, sempre esteve ao lado dos oprimidos. Assim viveu
este caríssimo camarada, falecido em 25 de junho de 2016. Deixou em Maricá, sua
companheira Dalva Torres, seus filhos Eliana e Abel, os netos Guilherme, Gustavo, Gabrielli, Maria
Clara, João Marcelo e Pedro Henrique e bisnetos.
Foto: Acervo da família
Edson Torres, seus filhos Eliana e Abel e a esposa Dalva Torres
Estive no seu enterro. Fui representando, em sentimentos, os ideais comuns que compartilhamos. Fiquei com as memórias do convívio com o repórter paraense, construídas nos inúmeros encontros que tivemos na cidade que nos acolheu.
* Jornalista
- Idealizador e produtor do documentário "Caçambada Cutuba - a história que Rondônia não escreveu" 2019.
- Autor do livro "Uma Frente Popular no Oeste do Brasil" 2023 - Editora Aquarius.
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